Educar não é tarefa fácil, pois além do carisma, da força de vontade, da perspicácia, da alegria, do carinho e do envolvimento pessoal que essa carreira implica, é obrigatório o confronto e o questionamento para com a competência. A tarefa de educar implica em orientação continuada e supervisão técnica e pedagógica para manter o profissional competente.
Além disso, podemos ressaltar outros complicadores tais como a necessidade de promover uma interação humana dentro do ambiente de trabalho, sobretudo porque esse deve ser um objetivo muito claro dentro de todos os ambientes educacionais. Esse é o trabalho que uma escola exige. Uma equipe de educadores deve ser orientada para uma força tarefa interdisciplinar. É fundamental termos uma equipe afinada e coesa para lidar com as crianças. Começando desde cedo vamos construindo cognições continuadas, crescentes e com saltos qualitativos.
MUITAS VEZES, O PROFESSOR TEM BOA FORMAÇÃO TEÓRICA, MAS PASSA POR DIFICULDADES POR TER TIDO UMA VIVÊNCIA REDUZIDA NA PARTE PRÁTICA. ISTO ATRAPALHA?
Em todos os países desenvolvidos, há escolas para professores. Um professor não pode ser jogado
“aos leões”. Educar é uma especialidade, seja no nível que for, da educação infantil à universidade. Não adianta achar que entende do assunto e sair dando aulas. É preciso assumir a pedagogia, ter um método de trabalho e planejar muito bem. O professor não é um “quebra galho”.
QUE IMPACTO TERIA UMA EXPANSÃO SIGNIFICATIVA DO ACESSO À EDUCAÇÃO INFANTIL DE QUALIDADE?
Se tivermos uma proposta atenta para a educação infantil teremos uma juventude cheia de si,
com elevada capacidade de raciocínio, autônoma, confiante e engajada em seus próprios projetos
de vida. A universidade é um coroamento do processo educacional, mas não é essencial. As complacências para facilitar o acesso ao ensino superior, tais como o sistema de cotas, não serão mais necessárias. Todos terão desenvolvido competência para ingressar na universidade quando optarem por isso. Toda a nossa gente terá a mesma chance.
A SENHORA TAMBÉM É ESPECIALISTA EM NEUROLINGUÍSTICA E NO ENSINO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS. DIANTE DISTO, GOSTARÍAMOS DE PERGUNTAR: POR QUE, QUANTO MENOR A IDADE DA PESSOA, MAIS FACILMENTE ELA APRENDE UMA LÍNGUA ESTRANGEIRA?
Ela aprende, facilmente, uma ou várias línguas. Uma criança brasileira, por exemplo, vai falar português não porque seus genes sabem em que país ela nasceu, mas porque no seu ambiente de
convívio se fala essa língua. Quanto mais jovem, mais facilmente o indivíduo aprende. No Brasil, os avanços na expansão da oferta de vagas, nas últimas décadas, têm se limitado ao ensino fundamental. Em vários segmentos, há um apelo para aumentar o número de concluintes no ensino médio mas, na etapa que é considerada por muitos educadores a base para o aprendizado, a educação infantil, o país ainda tem um longo caminho a percorrer, principalmente na faixa de 0 a 3 anos.
E não é por acaso que tem crescido, também, a cobrança por abertura de mais vagas em creches e préescolas. Mestre em Neurolinguística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pedagoga há mais de 30 anos, a professora Eloísa Lima, nos últimos anos, tem se dedicado ao estudo da construção do aprendizado nos primeiros anos de vida das crianças. Seu foco é a assimilação da Língua Estrangeira mas as conclusões deixam claro o quanto pode fazer diferença o acesso ao ensino nos cinco primeiros anos de vida. “Devemos ‘alimentar’ e fazer crescer o cérebro para que possamos formar adultos capazes de atingir um pensamento autônomo e conquistar uma profissão correspondente à demanda de um mercado de trabalho”, defendeu a especialista.
DE QUE FORMA ISTO SE PROCESSA NA FORMAÇÃO DAS ESTRUTURAS CEREBRAIS?
A massa encefálica aumenta proporcionalmente aos estímulos que recebe. Quanto mais ativamos as áreas cognitivas, mais elas se interfaceiam, mais elas promovem cognições. Uma metodologia que atenda satisfatoriamente a um adulto não atende às crianças, pois a forma de se adquirir a linguagem não é mais a mesma. As crianças, até em torno dos sete anos de idade, estão no “prazo de validade” da sua capacidade neuronal para adquirir linguagem. Após este prazo, que chamamos na linguística de período crítico, passamos a precisar de uma infinidade de outras cognições para aprender uma nova língua, tornando o esforço mental bem mais dispendioso.
O “custo” dessa operação, com a pessoa mais velha, fica muito caro. Um indivíduo é chamado
de adulto para a linguagem quando ele já passou dos sete anos.
TAMBÉM É COMUM AFIRMAR QUE, QUANDO UMA PESSOA JÁ DOMINA UM IDIOMA APRENDE OUTROS MAIS FACILMENTE. ISTO É MITO OU VERDADE?
É verdade sim! Quando aprendemos ou lidamos com mais idiomas, abrimos portas seguras para
outros saberes. As línguas têm princípios em comum. Todas têm um sujeito, um verbo, um objeto, etc. O que altera a Língua são os parâmetros. Em que parte da frase se coloca, por exemplo, o sujeito ou o verbo? Essa é uma questão de parâmetros.
A SENHORA ESTÁ À FRENTE DO DICE ENGLISH COURSE, QUE SE PROPÕE A TRABALHAR A LÍNGUA ESTRANGEIRA A PARTIR DOS SEIS MESES DE IDADE. COMO ISTO É POSSÍ- VEL?
O período pré-fala (de zero a mais ou menos um ano de vida) é de extrema importância para a linguagem. É quando se constituem as fundações. Enquanto estamos imersos interativamente entre falantes de certo idioma, estamos recebendo informações sobre ritmo da língua, pronunciação, morfologia, sintaxe, semântica. Em torno dos dois meses e vinte dias de vida, os indivíduos já conseguem chegar a bom termo sobre aonde inicia e termina uma palavra, quando ouvem esta em uma frase.
Conseguimos, rapidamente, com pouquíssimos estímulos, parear um objeto e seu nome. Vendo um “copo”, e ouvindo a palavra copo, conseguimos achar um copo no meio de outros objetos que não sejam copo, e chamar esse objeto de, por exemplo, “glass”, reconhecendo-o como tal. Contamos com ativações cerebrais a favor da linguagem desde a fase intrauterina e ao longo dos primeiros 12 meses de vida, tempo em que ainda não há oralidade propriamente.
MAS, NÃO EXISTE A NECESSIDADE DE JÁ SABER O IDIOMA NATIVO, ATÉ PARA ESTABELECER REFERÊNCIAS DA LÍNGUA ESTRANGEIRA COM A FALADA PELA CRIANÇA?
A necessidade da tradução, o que automaticamente ocorre quando se começa o contato com o idioma após o período crítico para a linguagem, é uma necessidade que tem o aluno adulto. Um adulto, mesmo passando a conviver no país do idioma que passou a conhecer após o período critico, carregará, inevitavelmente, o acento de seu idioma nativo nesse. Será para sempre um falante estrangeiro desse idioma, mesmo que passe a residir e só conviver com
falantes nativos deste segundo idioma para sempre. Um bom exemplo é o dos cubanos que moram em Miami há mais de 40 anos e que falam o inglês com o sotaque de espanhol, ao contrário de seus filhos.
A criança, ainda na primeira infância, pode falar outras línguas como os nativos destas. A partir de três ou quatro anos já se considera a criança um falante “nearnative” (próximos do nativo).
COMO AVALIA OS MÉTODOS UTILIZADOS, EM GERAL, POR NOSSAS ESCOLAS, PARA O ENSINO DE INGLÊS?
Há inúmeros métodos de trabalho no campo da educação. E a grande dúvida que paira na atmosfera educacional é sobre que metodologia dá certo com as crianças pequenas. Iria mais longe e perguntaria qual metodologia, de fato, ensina? E, sendo mais acadêmica ainda, vou afirmar que toda metodologia funciona quando cumprida, realizada, levada a sério... Contudo, o foco de uma metodologia educacional não pode ficar a favor do ensinar. Esse é o foco do professor. Deve se instalar o foco no aprendizado. O aluno deve ser o alvo da escola.
PODE NOS DAR UM EXEMPLO?
Falo, então, sobre uma metodologia consagrada e, ainda hoje, polêmica. Em se tratando da fase em que alunos são só ação e emoção, - até em torno de três anos as crianças aprendem o mundo desse modo -, Jean Piaget chamou essa etapa da vida de nível sensório- motor. Como fazer para motivá-las se elas ainda mal conseguem representar seu pensamento em palavras? Precisamos saber do que elas são capazes para assim estimulá-las para um nível acima. Precisamos
saber da noção de tempo que elas entendem e do espaço que ocupam, para, com todos esses saberes na manga, planejar uma aula agradável para elas, saber quanto tempo deve durar uma atividade e o que precisam essas criancinhas para atuar sobre sua própria escola. O que elas devem aprender para lidar com um amiguinho com alegria? Enfim, reunir todas essas questões que acabo de descrever é no mínimo um bom começo para a pedagogia infantil.
É o tão almejado construtivismo sequencial proposto pela teoria evolucionista do epistemólogo suíço, que não era pedagogo, Jean Piaget.
O QUE É IMPORTANTE PARA UM BOM PROFESSOR DE INGLÊS?
O professor deve ser fluente, ter proficiência total nas quatro habilidades. Para poder falar, espontaneamente tal língua, ele precisa de plena compreensão, conseguir se estruturar em frases (expressão oral), ler e escrever. Deve aprender a se fazer entender sem traduzir o tempo todo durante a aula. Falar em Português não “vale”, isso eles já sabem. A ação é um meio de tradução; a fotografia também traduz e é a representação mais próxima do objeto real. A manipulação dos objetos, dublados pela fala contextualizada é um modo de “tradução” e, sem duvida, a atitude mais acertada de um profissional de inglês para as crianças.
A FALTA DESTE “PROFESSOR PROFICIENTE” AGRAVA AINDA MAIS A QUESTÃO DO ENSINO DE IDIOMAS NAS ESCOLAS?
Sim. Um falante fluente de um idioma raramente comparece às escolas públicas ou particulares, até porque pode ganhar, pelo menos, cinco vezes mais se trabalhar como secretário bilíngue numa empresa.
Descendo ainda mais fundo no poço e, acendendo a lanterna bem lá embaixo, diria eu: quem encara uma sala de aula às cegas, no grito, sem saber a Língua, sem saber o que fazer, sem ter um material especializado ou sem salário digno é, no mínimo, alguém descrente de que se possa vir a falar Inglês na vida ou, na melhor das hipóteses, termina preferindo ensinar Português, já que constata que nem isso sabem. E, não sabem mesmo! Também não sabem Estudos Sociais, nem Matemática, nem Ciências... Como nessas matérias, raramente, são aferidos os conhecimentos ao longo da vida cotidiana, os alunos saem da escola, ingressam na universidade
e nunca mais usarão estes saberes. O mesmo já não ocorre com o Inglês ou o Espanhol,por exemplo. Para com esses saberes aparece sempre uma pessoa para inquirir o que você sabe. E, nestas ocasiões, não dá para fingir que sabe.
NA MEDIDA EM QUE AS GERAÇÕES SE SUCEDEM, TORNAM-SE CADA VEZ MAIS ADEPTAS DOS RECURSOS DA MÍDIA COMO FORMAS DE ENTRETENIMENTO (COMPUTADOR, GAMES, IPODS, ETC). COMO USAR ISTO EM PROL DO ENSINO DA LÍNGUA ESTRANGEIRA?
Todo e qualquer recurso de mídia é altamente eficaz para o desenvolvimento de uma Língua, porém quando já se tem uma luz no fim do túnel. Para os iniciantes, o benefício é apenas áudio fônico. Como se costuma dizer: “é bom para habituar o ouvido”. Esses materiais são excelentes para manutenção e aperfeiçoamento do idioma para quem já fala ou escreve alguma coisa na língua.
PORÉM, NA MAIOR PARTE DAS ESCOLAS BRASILEIRAS, O INGLÊS, QUANDO EXISTE, SE PAUTA BASICAMENTE EM LIVROS DIDÁTICOS. COMO AVALIA A QUALIDADE DELES?
Não acredito em nenhum material que traga um conteúdo prático engessado. Com um livro didático não se pode contar com a língua natural, coloquial, espontânea. Por isso, ele artificializa
o idioma. E digo mais, tão logo a criança tenha folheado o livro, explorado as novidades contidas,
não há mais o que lhe motive retornar ao material, sobretudo se for para fazer exercícios
enfadonhos. O livro didático se torna obsoleto e desgastado. Nunca devemos esquecer que aprendemos a ler para nos divertir e não para treinar o punho escrevendo. E escrever repetidamente sob um modelo fornecido é o que se tem proposto num livro seriado que é o máximo que uma escola entrega de material nas mãos dos professores.
Logo, um método calcado em livros didáticos é artificial, repetitivo, enfadonho, engessado
e, por isso, em nada contribui com uma atividade inteligente do indivíduo. Acabamos tendo um
desperdício de árvores.
QUANDO UMA FAMÍLIA DECIDE QUE SEU FILHO, NA IDADE ADULTA, NÃO VAI SOFRER AS RESTRIÇÕES NO MERCADO DE TRABALHO QUE SEUS PAIS SOFRERAM POR NÃO SABER INGLÊS, BUSCAM UM CURSO PARA ELE. QUANDO TEM ABAIXO DE 6 OU 7 ANOS, FICA ÓBVIO QUE ELES NÃO DEVERÃO ESCREVER NESSA LÍNGUA PORQUE AINDA NÃO SABEM LER E ESCREVER NA LÍNGUA MATERNA. QUE CUIDADOS A SENHORA DESTACARIA NA HORA DA ESCOLHA DE UM CURSO DE INGLÊS, NÃO APENAS PARA OS ALUNOS ABAIXO DESSA FAIXA ETÁRIA, COMO TAMBÉM ACIMA?
Um tópico deveras importante na aplicação da metodologia Dice, além de ser considerado um
dos mais polêmicos diferenciais entre o nosso e os outros métodos tradicionais de ensino de línguas, é a questão de como encaminhamos a alfabetização dos nossos alunos na segunda língua.
Assim como na língua nativa, só conseguimos ler e escrever quando capazes de nos comunicar oralmente, acreditamos que, tão logo possamos contar com o aluno se comunicando através de estruturas da língua inglesa, ele será capaz de ler o que já conhece oralmente e, porque o sistema fonético, para o falante do Português, é diferente do Inglês, aguardamos um pouco para obter uma produção escrita por parte dos alunos. Normalmente essas habilidades, ler e escrever, vão ocorrer no período entre sete e nove anos (variando conforme a idade que iniciou o contato com o Inglês) e, pelo tempo de escolaridade brasileira em que já deverão ter acumulado, certamente estarão bem estruturados na escrita da primeira língua. Contamos em equipá-los na escrita já com domínio desta habilidade no Português. Assim, em menos de três meses de trabalho, obtemos tranquilidade dos alunos no lidar com a escrita e colhemos excelentes
resultados na escrita do Inglês.
Professora Eloísa Lima: “toda metodologia funciona quando cumprida, realizada, levada a sério”